Nós nascemos com a capacidade de ver, mas a nossa visão nos primeiros momentos de vida é limitada. Enquanto recém-nascidos só conseguimos ver com claridade e nitidez imagens que estejam a cerca de 30 centímetros. Para lá dos 30 ou 40 centímetros somos incapazes de ver.
Mas conseguimos, claramente, focar a nossa visão naquilo que é mais importante nesta altura, o rosto de quem cuida e gosta de nós. E se há coisa que nós gostamos quando somos bebés é que cuidem e gostem de nós, adoramos que olhem para nós e se deliciem com a nossa simples existência.
À medida que crescemos, aprendemos a ver o mundo como ele é, ou assim acreditamos. E a nossa vida passa a ser um reflexo da forma como vemos o mundo, como nos vemos e como vemos os outros. Achamos que somos meramente observadores da realidade pura e crua, uma espécie de cientistas do universo que recolhem dados com a imparcialidade de um espectador desinteressado. Só que não.
Enquanto humanos, temos uma necessidade de extrair significado daquilo que nos acontece. Lidar com o aleatório é umas das coisas mais desafiantes para a mente humana que é uma contadora de histórias por natureza.
E não demora muito até nos aventurarmos
na arte do Storytelling.
Se o pai passa pouco tempo em casa e não brinca connosco é porque não gosta de nós. Quando os pais se divorciam é porque fomos tão mal comportados que acabaram por se fartar da confusão. Quando o primeiro namorado nos trai, é porque não somos suficientemente bonitas, não lhe chegámos. À primeira nota menos satisfatória a matemática, é porque não somos pessoas de números…. E de história em história vamos elaborando uma narrativa, à volta da qual nos construímos enquanto pessoas.
É claro que nem todas as narrativas nos limitam e prejudicam. Há pessoas que constroem narrativas de eficácia, força e resiliência, estas narrativas permitem-lhes ultrapassar obstáculos, arriscar e ir atrás dos seus objectivos e sonhos. Mas muitas vezes, construímos narrativas que nos aprisionam e nos impedem de viver autenticamente.
É à luz das nossas narrativas que vemos o mundo. Vemos, antes de mais, através das nossas percepções, que são um agregado das nossas experiências passadas, dos nossos medos, expectativas e crenças…. A maior parte destas histórias, foram elas próprias influenciadas pelas percepções dos nossos pais, professores e pessoas significativas na nossa vida.
Como bons investigadores que somos, vamos andando pelos dias que fazem uma vida, à procura daquilo que nos comprova que a realidade, de facto é como a contamos (é o chamado enviesamento confirmatório). E é assim, que tantas vezes nos esquecemos de parar e questionar, se é neste ângulo que queremos viver a vida? Ou se nos atrevemos a viver com a leveza e coragem de quem se dispõe a aprender a ver?
Aprender a ver implica um ato contínuo de desconstrução. Um constante questionar não só daquilo que se observa, mas do observador em si. Ou seja, ao que nos leva a ver o que vemos.
Parece complexo, mas na verdade é o desembrulhar da vida.
E o primeiro passo para desembrulhar, é perceber que estamos embrenhados. É parar e dizer a nós próprios a história que eu estou a contar sobre aquilo que estou a ver é esta… Esta pausa introduz um espaço, é como se a partir daqui conseguíssemos ver na tela da nossa mente a história que estamos a criar, em vez de estarmos completamente absorvidos nela. É passarmos de actores a realizadores.
Daqui podemos voltar a atenção ao nosso corpo, às sensações e emoções, à forma como se manifestam no nosso sistema, e em vez de as sujeitarmos ao escrutínio do julgamento, oferecemos à nossa experiência interna a atenção, aceitação e compaixão que ela necessita. E deixamos que as histórias sejam isso mesmo, nada mais que histórias.
Aprender a ver é parar e perguntar:
• De onde é que vem esta história?
• Esta história pertence-me ou pertence a outra pessoa?
• Até que ponto esta história representa a minha verdade neste momento?
• Isto está a contribuir ou a diminuir o meu bem-estar e a minha capacidade de viver como eu quero viver?
• E agora, quero continuar a viver esta história, ou quero escrever outra?
Aprender a ver é este desconstruir constante, é tirar as lentes que não nos servem, do auto-julgamento, da autocrítica, da “duvidite aguda” e pôr as lentes da atenção, da curiosidade, da aceitação e compaixão.
Aprender a ver é parar mais vezes. É respirar profundamente. É voltar ao que é mais sincero em nós. É voltar ao corpo, fazer as pazes com a mente e seguir a voz da coragem. É voltar ao que nos enche as horas de gratidão. Àquilo que nos liberta e encoraja a sermos autênticos, espontâneos e livres nas nossas escolhas.
Aprender a ver é voltar a saber que merecemos ser vistos, cuidados e amados. Mesmo. É expressar as nossas necessidades, arejar as frustrações, é partilhar sonhos e desejos. É abraçar quando se tem vontade, e chorar quando é preciso. É pedir desculpa se magoámos. É assumir quando falhámos, sabendo que não somos esse falhanço. É ir atrás daquilo que queremos e deixar para trás o que já nos fica apertado no ser.
Aprender a ver é focar no que é importante.
E desfocar do que não é para nós. É cuidar daquilo e dos que mais gostamos, e gostar que cuidem de nós.
Aprender a ver é viver desembrulhadamente. E atrevo-me a dizer, que nascemos a ver, de dentro para fora. Nascemos a ver e saber o essencial. E se calhar, viver é mais um voltar a ver de dentro aquilo que queremos cá fora. E assim nos deliciarmos com a nossa existência. Simples e bonita.
Aprender a Ver | Perspectivas da Realidade
Nós nascemos com a capacidade de ver, mas a nossa visão nos primeiros momentos de vida é limitada. Enquanto recém-nascidos só conseguimos ver com claridade e nitidez imagens que estejam a cerca de 30 centímetros. Para lá dos 30 ou 40 centímetros somos incapazes de ver.
Mas conseguimos, claramente, focar a nossa visão naquilo que é mais importante nesta altura, o rosto de quem cuida e gosta de nós. E se há coisa que nós gostamos quando somos bebés é que cuidem e gostem de nós, adoramos que olhem para nós e se deliciem com a nossa simples existência.
À medida que crescemos, aprendemos a ver o mundo como ele é, ou assim acreditamos. E a nossa vida passa a ser um reflexo da forma como vemos o mundo, como nos vemos e como vemos os outros. Achamos que somos meramente observadores da realidade pura e crua, uma espécie de cientistas do universo que recolhem dados com a imparcialidade de um espectador desinteressado. Só que não.
Enquanto humanos, temos uma necessidade de extrair significado daquilo que nos acontece. Lidar com o aleatório é umas das coisas mais desafiantes para a mente humana que é uma contadora de histórias por natureza.
E não demora muito até nos aventurarmos
na arte do Storytelling.
Se o pai passa pouco tempo em casa e não brinca connosco é porque não gosta de nós. Quando os pais se divorciam é porque fomos tão mal comportados que acabaram por se fartar da confusão. Quando o primeiro namorado nos trai, é porque não somos suficientemente bonitas, não lhe chegámos. À primeira nota menos satisfatória a matemática, é porque não somos pessoas de números…. E de história em história vamos elaborando uma narrativa, à volta da qual nos construímos enquanto pessoas.
É claro que nem todas as narrativas nos limitam e prejudicam. Há pessoas que constroem narrativas de eficácia, força e resiliência, estas narrativas permitem-lhes ultrapassar obstáculos, arriscar e ir atrás dos seus objectivos e sonhos. Mas muitas vezes, construímos narrativas que nos aprisionam e nos impedem de viver autenticamente.
É à luz das nossas narrativas que vemos o mundo. Vemos, antes de mais, através das nossas percepções, que são um agregado das nossas experiências passadas, dos nossos medos, expectativas e crenças…. A maior parte destas histórias, foram elas próprias influenciadas pelas percepções dos nossos pais, professores e pessoas significativas na nossa vida.
Como bons investigadores que somos, vamos andando pelos dias que fazem uma vida, à procura daquilo que nos comprova que a realidade, de facto é como a contamos (é o chamado enviesamento confirmatório). E é assim, que tantas vezes nos esquecemos de parar e questionar, se é neste ângulo que queremos viver a vida? Ou se nos atrevemos a viver com a leveza e coragem de quem se dispõe a aprender a ver?
Aprender a ver implica um ato contínuo de desconstrução. Um constante questionar não só daquilo que se observa, mas do observador em si. Ou seja, ao que nos leva a ver o que vemos.
Parece complexo, mas na verdade é o desembrulhar da vida.
E o primeiro passo para desembrulhar, é perceber que estamos embrenhados. É parar e dizer a nós próprios a história que eu estou a contar sobre aquilo que estou a ver é esta… Esta pausa introduz um espaço, é como se a partir daqui conseguíssemos ver na tela da nossa mente a história que estamos a criar, em vez de estarmos completamente absorvidos nela. É passarmos de actores a realizadores.
Daqui podemos voltar a atenção ao nosso corpo, às sensações e emoções, à forma como se manifestam no nosso sistema, e em vez de as sujeitarmos ao escrutínio do julgamento, oferecemos à nossa experiência interna a atenção, aceitação e compaixão que ela necessita. E deixamos que as histórias sejam isso mesmo, nada mais que histórias.
Aprender a ver é parar e perguntar:
• De onde é que vem esta história?
• Esta história pertence-me ou pertence a outra pessoa?
• Até que ponto esta história representa a minha verdade neste momento?
• Isto está a contribuir ou a diminuir o meu bem-estar e a minha capacidade de viver como eu quero viver?
• E agora, quero continuar a viver esta história, ou quero escrever outra?
Aprender a ver é este desconstruir constante, é tirar as lentes que não nos servem, do auto-julgamento, da autocrítica, da “duvidite aguda” e pôr as lentes da atenção, da curiosidade, da aceitação e compaixão.
Aprender a ver é parar mais vezes. É respirar profundamente. É voltar ao que é mais sincero em nós. É voltar ao corpo, fazer as pazes com a mente e seguir a voz da coragem. É voltar ao que nos enche as horas de gratidão. Àquilo que nos liberta e encoraja a sermos autênticos, espontâneos e livres nas nossas escolhas.
Aprender a ver é voltar a saber que merecemos ser vistos, cuidados e amados. Mesmo. É expressar as nossas necessidades, arejar as frustrações, é partilhar sonhos e desejos. É abraçar quando se tem vontade, e chorar quando é preciso. É pedir desculpa se magoámos. É assumir quando falhámos, sabendo que não somos esse falhanço. É ir atrás daquilo que queremos e deixar para trás o que já nos fica apertado no ser.
Aprender a ver é focar no que é importante.
E desfocar do que não é para nós. É cuidar daquilo e dos que mais gostamos, e gostar que cuidem de nós.
Aprender a ver é viver desembrulhadamente. E atrevo-me a dizer, que nascemos a ver, de dentro para fora. Nascemos a ver e saber o essencial. E se calhar, viver é mais um voltar a ver de dentro aquilo que queremos cá fora. E assim nos deliciarmos com a nossa existência. Simples e bonita.
PERSPECTIVA
DESCONSTRUÇÃO
ACEITAÇÃO
Catarina Lino
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