No tempo em que vivemos, em que muitos sentem – e alguns sofrem – com a aparente descartabilidade das relações, com os múltiplos desafios que os relacionamentos enfrentam, com a perceção quase generalizada de que encontrar um novo parceiro está, muitas vezes, à distancia de um “clique”…
Será que ainda é possível ou até realista
acreditar no amor?
Terão as redes sociais e as aplicações de encontros acabado com o romance? Teremos deixado de lutar pelas relações com o afinco e empenho de antes? Será que conceitos como os de fidelidade e compromisso correm perigo ou, pelo menos, carecem de reformulação e reenquadramento?
As relações são atualmente encaradas e vividas de uma forma menos formal e, porventura, menos idealizada e romantizada.
A crescente agitação do tempo e espaço que habitamos aumenta os desafios a que estas estão sujeitas, com a existência de sites, aplicações e toda uma panóplia de recursos tecnológicos a contribuir para a proliferação da imagem de que as pessoas são facilmente substituíveis, ideia que faz com que muitas pessoas não se sintam valorizadas nas suas idiossincrasias, no que as torna únicas e especiais.
A banalização da utilização destes meios veio alterar o paradigma do processo de sedução, que ocorre agora, na sua grande maioria, através de um ecrã e com recurso a imagens e mensagens.
É frequente a marcação de um encontro após pouco tempo de interação. Até porque se, antes, os primeiros encontros tinham como objetivo primordial a descoberta do outro, da sua história e especificidades, agora, quando as pessoas se encontram, já há pouco por descobrir, com a maior parte da vida espelhada online, à distância de uma pesquisa.
A este propósito, tenhamos em consideração que todos selecionamos o que mostramos online, com esta seleção a recair, naturalmente, sobre aquilo que consideramos mais atrativo e apelativo.
A quanto do verdadeiro eu, do outro lado do ecrã,
teremos nós real acesso?
Uma questão que nos deve fazer pensar.
Não há dúvida que a possibilidade de conhecer pessoas através de ferramentas online pode ser extremamente útil para quem, por exemplo, pelo momento da vida em que se encontra (assoberbado com tarefas familiares e de casa, exigências profissionais, etc.), tem escassez de tempo e disponibilidade efetiva para conhecer novas pessoas, fora do círculo habitual de amigos e conhecidos.
Contudo, em pessoas com escassez de competências sociais, pode haver uma inibição ainda maior e a ausência de procura ativa de contextos promotores do estabelecimento de relações interpessoais, como os das atividades de tempos livres.
Se, por um lado, estes novos modos de travar conhecimento trouxeram ganhos reais ao nível da liberdade, com cada vez menos pessoas a ficarem presas em “relações para a vida” (o que sucedia mesmo quando estas eram disfuncionais e insatisfatórias) e um ganho de à vontade na vivência da sexualidade; por outro, existe o reverso da medalha, quando se criam expectativas desfasadas da realidade e/ou das daqueles com quem se interage.
É fundamental ter bem presentes os objetivos e expetativas com que se conhecem pessoas online, uma vez que nunca se sabe o verdadeiro nível de correspondência com o real – quantas pessoas não começam, desde logo, por usar uma imagem ou fotografia que nem é a sua?
Esta desconfiança, sobretudo se efetivamente confirmada por uma, ou mais, interações, pode levar a um olhar mais cínico sobre as pessoas e o mundo relacional em geral.
No processo de sedução online os papéis de género estão mais diluídos, com homens e mulheres a tomarem indiferenciadamente a iniciativa de colocar likes, conversar, sugerir marcação de um encontro, etc.
Existem, mesmo, aplicações como a Bumble, que pressupõem que seja a mulher a tomar a iniciativa.
Quando se dá a passagem para o mundo “real”, existe quem procure encontros pontuais, com um objetivo predominantemente sexual, mas também quem recorra ao universo online para potenciar a possibilidade de estabelecer uma relação, intencionalmente estável e duradoura.
É, ainda, frequente, existir quem se encontre com mais do que uma pessoa em simultâneo, com a consequente diminuição do investimento e empenho, num processo em que se avalia qual dos encontros “corre melhor” ou com que pessoa se sente mais empatia.
Neste caso, o mais importante é que não existam ocultações, de modo a evitar um desencontro de expetativas, quando do outro lado está alguém a investir num só contacto e que acredita – ou espera – que essa “exclusividade” seja recíproca.
Já o envolvimento sexual é, muitas vezes, uma forma de “testar” se existe atração física que justifique novos contactos e encontros, ao invés de surgir como uma consequência dessa mesma atração, constatada através de conversas e movimentos mais subtis.
Se o relacionamento sexual não for satisfatório, será “normal” que aquelas pessoas nunca mais voltem a comunicar, agindo como se nunca se tivessem conhecido e passando a novos processos de conquista.
Em síntese, a regra predominante passou a ser
a ausência de regras.
Existe uma maior flexibilidade, fluidez, rapidez (perceção de que “não há tempo a perder”) e volatilidade em todo o processo de sedução e de concretização de encontros, alicerçada na ideia, em muito fomentada e alimentada pelas diversas aplicações e sites de encontros de que, se a pessoa X demora muito tempo a responder, hesita em marcar um encontro ou é mais resistente a um envolvimento físico, existirá todo um restante abecedário disponível, igualmente atrativo e interessado em conquistar e ser conquistado.
É este o mundo “VUCA” (acrónimo que traduzido do inglês significa volátil, incerto, complexo, ambíguo) em que vivemos, também, ao nível relacional.
O aumento de adeptos do conhecimento por via online pode levar a um desinvestimento na interação “cara a cara” e nas relações “reais”, conduzindo a um maior isolamento social e a uma consequente diminuição das redes sociais e de suporte.
Adicionalmente, ideias como as da aparente facilidade em encontrar pessoas e relações “perfeitas”, em que tudo corre bem e em que a novidade está sempre presente, podem levar a que estas aplicações contenham um potencial aditivo.
Contudo, e com o passar do tempo, esta constante adrenalina, o conhecer e “desconhecer” pessoas, pode gerar cansaço, um sentimento de insatisfação permanente e, mesmo, descrença nas relações.
É preciso estar preparado para a desilusão – é possível passar muito tempo a investir numa interação online e de repente a pessoa desaparecer, como se nunca tivesse sequer existido (fenómeno que recebe o nome de Ghosting).
Também pode existir uma falsa ideia de proximidade – quando estamos online temos muitas pessoas com quem falar, mas, se tivermos uma necessidade real de ajuda, com quantas pessoas poderemos efetivamente contar?
Parece ser também verdade que hoje se desiste mais facilmente das relações quando surgem dificuldades ou obstáculos, ao invés de tentar reparar o que está menos bem, sendo cada vez menos trabalhadas as capacidades de resistência à frustração e de resolução de problemas.
Quando algo não corre bem,
evita-se ou desiste-se.
Também se pode instalar uma desconfiança quase “crónica” – mesmo quando uma interação online evolui para algo mais sério pode-se instalar a dúvida: “Se usou a aplicação para me conhecer, quem me garante que não vai voltar a usá-la e trocar-me por alguém mais interessante?”.
A interação (por escrito ou “ao vivo”) com um maior número de pessoas do que seria possível sem a existência do “universo online” pode potenciar a possibilidade de encontrar alguém com uma maior confluência de interesses, sendo que destas interações podem resultar envolvimentos meramente pontuais (sexuais), relações amorosas, relações de amizade, ou apenas contactos que se diluem no tempo.
No pior dos cenários, e quando as experiências são persistentemente negativas, pode existir um somatório de desilusões e uma (quase) desistência de investir em relações.
A tendência será a de que as relações sejam cada vez mais “líquidas”, com perdas ao nível da união/conexão, e uma maior acumulação de experiências relacionais. Esta realidade não é categoricamente positiva ou negativa, na medida em que depende daquilo que cada um retira, ou pretende retirar, das relações que estabelece.
Zygmnunt Bauman, sociólogo e filósofo polaco, no seu livro “Amor Líquido”, escreve que “(…) a modernidade líquida em que vivemos traz consigo uma misteriosa fragilidade dos laços humanos – um amor líquido. A insegurança inspirada por essa condição estimula desejos conflituosos de estreitar esses laços e, ao mesmo tempo, mantê-los frágeis”.
Para o autor, o “amor líquido” é um amor construído a partir do padrão dos bens de consumo, que são mantidos enquanto trazem satisfação para serem, depois, e com aparente facilidade, substituídos por outros que prometem mais satisfação.
Na sua forma “líquida”, o amor tenta trocar
a qualidade pela quantidade.
A superficialidade das relações humanas gerou um conjunto de laços e indivíduos “descartáveis”. Se algo não está bom, deita-se fora!
Poucos de nós pensam que “o caçador também se pode tornar caça” – lidar com diversas pessoas descartáveis torna-nos, igualmente, descartáveis.
Para Bauman as relações atuais enfrentam uma série de dualidades. Temos necessidade de liberdade, mas sentimos medo quando a liberdade é exercida pelo outro; ficamos inseguros perante a possibilidade de nos entregarmos, mas desejamos que o outro se nos entregue completamente; precisamos de tranquilidade, mas alimentamos expetativas permanentes face aos demais.
Estamos, assim, perante um enorme paradoxo entre o desprendimento e frivolidade que o mundo online promove e a necessidade intrinsecamente humana de criar e manter laços promotores de segurança, estabilidade e suporte emocional. Todos estes paradoxos criam conflitos mentais, inquietações e deceções permanentes nas relações modernas.
Não é possível ignorar que as relações são reflexo do tempo e espaço em que habitam e que sofremos influência do modo como os que nos rodeiam se comportam.
Contudo, isso não nos obriga à adoção de uma posição de aceitação passiva nem nos deve impedir de refletir sobre o modo como nos ligamos aos outros e de reavaliar – e, se necessário, alterar – atitudes e comportamentos.
Tal não significa necessariamente que se adote um regresso ao passado, mas antes, que se redefinam os valores vigentes e se pratiquem aqueles com que, efetivamente, nos identificamos.
Temos o livre arbítrio de “tocar” o mundo do outro conforme entendemos e de estabelecer laços consistentes com quem nos rodeia.
Esta é uma ameaça à saúde física, tão real e tangível, como globalmente mensurável, contudo, também o nosso mundo interior se encontra frágil e vulnerável.
Relacionamentos | O Virtual Matou o Real?
No tempo em que vivemos, em que muitos sentem – e alguns sofrem – com a aparente descartabilidade das relações, com os múltiplos desafios que os relacionamentos enfrentam, com a perceção quase generalizada de que encontrar um novo parceiro está, muitas vezes, à distancia de um “clique”…
Será que ainda é possível ou até realista
acreditar no amor?
Terão as redes sociais e as aplicações de encontros acabado com o romance? Teremos deixado de lutar pelas relações com o afinco e empenho de antes? Será que conceitos como os de fidelidade e compromisso correm perigo ou, pelo menos, carecem de reformulação e reenquadramento?
As relações são atualmente encaradas e vividas de uma forma menos formal e, porventura, menos idealizada e romantizada.
A crescente agitação do tempo e espaço que habitamos aumenta os desafios a que estas estão sujeitas, com a existência de sites, aplicações e toda uma panóplia de recursos tecnológicos a contribuir para a proliferação da imagem de que as pessoas são facilmente substituíveis, ideia que faz com que muitas pessoas não se sintam valorizadas nas suas idiossincrasias, no que as torna únicas e especiais.
A banalização da utilização destes meios veio alterar o paradigma do processo de sedução, que ocorre agora, na sua grande maioria, através de um ecrã e com recurso a imagens e mensagens.
É frequente a marcação de um encontro após pouco tempo de interação. Até porque se, antes, os primeiros encontros tinham como objetivo primordial a descoberta do outro, da sua história e especificidades, agora, quando as pessoas se encontram, já há pouco por descobrir, com a maior parte da vida espelhada online, à distância de uma pesquisa.
A este propósito, tenhamos em consideração que todos selecionamos o que mostramos online, com esta seleção a recair, naturalmente, sobre aquilo que consideramos mais atrativo e apelativo.
A quanto do verdadeiro eu, do outro lado do ecrã,
teremos nós real acesso?
Uma questão que nos deve fazer pensar.
Não há dúvida que a possibilidade de conhecer pessoas através de ferramentas online pode ser extremamente útil para quem, por exemplo, pelo momento da vida em que se encontra (assoberbado com tarefas familiares e de casa, exigências profissionais, etc.), tem escassez de tempo e disponibilidade efetiva para conhecer novas pessoas, fora do círculo habitual de amigos e conhecidos.
Contudo, em pessoas com escassez de competências sociais, pode haver uma inibição ainda maior e a ausência de procura ativa de contextos promotores do estabelecimento de relações interpessoais, como os das atividades de tempos livres.
Se, por um lado, estes novos modos de travar conhecimento trouxeram ganhos reais ao nível da liberdade, com cada vez menos pessoas a ficarem presas em “relações para a vida” (o que sucedia mesmo quando estas eram disfuncionais e insatisfatórias) e um ganho de à vontade na vivência da sexualidade; por outro, existe o reverso da medalha, quando se criam expectativas desfasadas da realidade e/ou das daqueles com quem se interage.
É fundamental ter bem presentes os objetivos e expetativas com que se conhecem pessoas online, uma vez que nunca se sabe o verdadeiro nível de correspondência com o real – quantas pessoas não começam, desde logo, por usar uma imagem ou fotografia que nem é a sua?
Esta desconfiança, sobretudo se efetivamente confirmada por uma, ou mais, interações, pode levar a um olhar mais cínico sobre as pessoas e o mundo relacional em geral.
No processo de sedução online os papéis de género estão mais diluídos, com homens e mulheres a tomarem indiferenciadamente a iniciativa de colocar likes, conversar, sugerir marcação de um encontro, etc.
Existem, mesmo, aplicações como a Bumble, que pressupõem que seja a mulher a tomar a iniciativa.
Quando se dá a passagem para o mundo “real”, existe quem procure encontros pontuais, com um objetivo predominantemente sexual, mas também quem recorra ao universo online para potenciar a possibilidade de estabelecer uma relação, intencionalmente estável e duradoura.
É, ainda, frequente, existir quem se encontre com mais do que uma pessoa em simultâneo, com a consequente diminuição do investimento e empenho, num processo em que se avalia qual dos encontros “corre melhor” ou com que pessoa se sente mais empatia.
Neste caso, o mais importante é que não existam ocultações, de modo a evitar um desencontro de expetativas, quando do outro lado está alguém a investir num só contacto e que acredita – ou espera – que essa “exclusividade” seja recíproca.
Já o envolvimento sexual é, muitas vezes, uma forma de “testar” se existe atração física que justifique novos contactos e encontros, ao invés de surgir como uma consequência dessa mesma atração, constatada através de conversas e movimentos mais subtis.
Se o relacionamento sexual não for satisfatório, será “normal” que aquelas pessoas nunca mais voltem a comunicar, agindo como se nunca se tivessem conhecido e passando a novos processos de conquista.
Em síntese, a regra predominante passou a ser
a ausência de regras.
Existe uma maior flexibilidade, fluidez, rapidez (perceção de que “não há tempo a perder”) e volatilidade em todo o processo de sedução e de concretização de encontros, alicerçada na ideia, em muito fomentada e alimentada pelas diversas aplicações e sites de encontros de que, se a pessoa X demora muito tempo a responder, hesita em marcar um encontro ou é mais resistente a um envolvimento físico, existirá todo um restante abecedário disponível, igualmente atrativo e interessado em conquistar e ser conquistado.
É este o mundo “VUCA” (acrónimo que traduzido do inglês significa volátil, incerto, complexo, ambíguo) em que vivemos, também, ao nível relacional.
O aumento de adeptos do conhecimento por via online pode levar a um desinvestimento na interação “cara a cara” e nas relações “reais”, conduzindo a um maior isolamento social e a uma consequente diminuição das redes sociais e de suporte.
Adicionalmente, ideias como as da aparente facilidade em encontrar pessoas e relações “perfeitas”, em que tudo corre bem e em que a novidade está sempre presente, podem levar a que estas aplicações contenham um potencial aditivo.
Contudo, e com o passar do tempo, esta constante adrenalina, o conhecer e “desconhecer” pessoas, pode gerar cansaço, um sentimento de insatisfação permanente e, mesmo, descrença nas relações.
É preciso estar preparado para a desilusão – é possível passar muito tempo a investir numa interação online e de repente a pessoa desaparecer, como se nunca tivesse sequer existido (fenómeno que recebe o nome de Ghosting).
Também pode existir uma falsa ideia de proximidade – quando estamos online temos muitas pessoas com quem falar, mas, se tivermos uma necessidade real de ajuda, com quantas pessoas poderemos efetivamente contar?
Parece ser também verdade que hoje se desiste mais facilmente das relações quando surgem dificuldades ou obstáculos, ao invés de tentar reparar o que está menos bem, sendo cada vez menos trabalhadas as capacidades de resistência à frustração e de resolução de problemas.
Quando algo não corre bem,
evita-se ou desiste-se.
Também se pode instalar uma desconfiança quase “crónica” – mesmo quando uma interação online evolui para algo mais sério pode-se instalar a dúvida: “Se usou a aplicação para me conhecer, quem me garante que não vai voltar a usá-la e trocar-me por alguém mais interessante?”.
A interação (por escrito ou “ao vivo”) com um maior número de pessoas do que seria possível sem a existência do “universo online” pode potenciar a possibilidade de encontrar alguém com uma maior confluência de interesses, sendo que destas interações podem resultar envolvimentos meramente pontuais (sexuais), relações amorosas, relações de amizade, ou apenas contactos que se diluem no tempo.
No pior dos cenários, e quando as experiências são persistentemente negativas, pode existir um somatório de desilusões e uma (quase) desistência de investir em relações.
A tendência será a de que as relações sejam cada vez mais “líquidas”, com perdas ao nível da união/conexão, e uma maior acumulação de experiências relacionais. Esta realidade não é categoricamente positiva ou negativa, na medida em que depende daquilo que cada um retira, ou pretende retirar, das relações que estabelece.
Zygmnunt Bauman, sociólogo e filósofo polaco, no seu livro “Amor Líquido”, escreve que “(…) a modernidade líquida em que vivemos traz consigo uma misteriosa fragilidade dos laços humanos – um amor líquido. A insegurança inspirada por essa condição estimula desejos conflituosos de estreitar esses laços e, ao mesmo tempo, mantê-los frágeis”.
Para o autor, o “amor líquido” é um amor construído a partir do padrão dos bens de consumo, que são mantidos enquanto trazem satisfação para serem, depois, e com aparente facilidade, substituídos por outros que prometem mais satisfação.
Na sua forma “líquida”, o amor tenta trocar
a qualidade pela quantidade.
A superficialidade das relações humanas gerou um conjunto de laços e indivíduos “descartáveis”. Se algo não está bom, deita-se fora!
Poucos de nós pensam que “o caçador também se pode tornar caça” – lidar com diversas pessoas descartáveis torna-nos, igualmente, descartáveis.
Para Bauman as relações atuais enfrentam uma série de dualidades. Temos necessidade de liberdade, mas sentimos medo quando a liberdade é exercida pelo outro; ficamos inseguros perante a possibilidade de nos entregarmos, mas desejamos que o outro se nos entregue completamente; precisamos de tranquilidade, mas alimentamos expetativas permanentes face aos demais.
Estamos, assim, perante um enorme paradoxo entre o desprendimento e frivolidade que o mundo online promove e a necessidade intrinsecamente humana de criar e manter laços promotores de segurança, estabilidade e suporte emocional. Todos estes paradoxos criam conflitos mentais, inquietações e deceções permanentes nas relações modernas.
Não é possível ignorar que as relações são reflexo do tempo e espaço em que habitam e que sofremos influência do modo como os que nos rodeiam se comportam.
Contudo, isso não nos obriga à adoção de uma posição de aceitação passiva nem nos deve impedir de refletir sobre o modo como nos ligamos aos outros e de reavaliar – e, se necessário, alterar – atitudes e comportamentos.
Tal não significa necessariamente que se adote um regresso ao passado, mas antes, que se redefinam os valores vigentes e se pratiquem aqueles com que, efetivamente, nos identificamos.
Temos o livre arbítrio de “tocar” o mundo do outro conforme entendemos e de estabelecer laços consistentes com quem nos rodeia.
No “nosso mundo” podemos fazer a diferença.
VIRTUAL
REAL
DESCARTÁVEL
Rita Fonseca de Castro
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